Sobre o "Arquivo Íntimo", de Tatiana Portela

Não é preciso conviver muito tempo com Tatiana para perceber o quão desinibida ela é, e o quanto ela se interessa pelas pessoas e deseja bisbilhotar seu mundo. Então, falar sobre a artista faz todo sentido quando vemos seu trabalho. Ela convida seu público para ir à sua casa e dormir lá. Ou, se for permitido, se convida para ir à casa de seu público e dormir lá também. Mas não se interessa tanto pelo ato de dormir quanto pelo de acordar. Dormir implica em entrar em estado de letargia, mas acordar, implica em deixar esse estado, e isso a interessa.
Obra de arte, então, é isso. Envolvimento do artista e seu público; mas não se esgota aí. Ela espera que ambos acordem quase no mesmo horário, e registra esses momentos. Fotografa seu convidado ao acordar, em estado de se recuperar a razão, mas quando ainda não está com posse total dela. Fotografar o momento que o convidado acorda é eternizar o médium entre consciente e inconsciente.
De posse das fotografias, Tatiana as fotocopia e imprime duas cópias sobre um tecido bastante delicado, que depois transforma em travesseiros, dos quais um é devolvido para a pessoa registrada. “Um travesseiro é seu, um travesseiro é meu”. Ela devolve ao convidado um objeto que espera que participe de seu sono e acordar continuamente, ao mesmo tempo que constrói um relicário desses momentos.
Fica exposto depois de tudo o relicário, construído com o registro do acordar e a gravura desse registro sobre um tecido que é transformado num travesseiro.
Mas obra de arte é o bisbilhotar, que pretende ser envolvimento pessoal de artista com seu público.

Tatiana Portela é artista e professora, graduada em Artes Visuais pela Universidade Estadual de Londrina - UEL. Atualmente reside em Campinas - SP.